A GUERRA DO PENTE EM CURITIBA Quem vê as quadras historicamente repletas de comércio de rua diante da Praça Tiradentes, não imagina que um dia essa região foi palco de um episódio da história de Curitiba que ficou conhecido como “A Guerra do Pente", ocorrida no dia 08/12/1959. "A chamada “Guerra do Pente” foi um acontecimento excepcional e que causa ainda interrogações. Por que logo em Curitiba, se deram esses acontecimentos? Cidade de perfil europeu, com grande concentração de grupos étnicos alemães e eslavos, que se miscigenaram e que continuam neste processo de forma pacífica com os descendentes das outras etnias que aqui arribaram: claro os portugueses, os italianos, espanhóis, suíços, os árabes e os nossos autóctones. Interações étnicas que promoveram a modelação de seus habitantes, conhecidos como gente pacata e ordeira, praticantes religiosos e de um refinamento cultural acima da média brasileira. Proclamados como cidadãos de costumes sóbrios e um tanto tímidos em suas manifestações sociais, os curitibanos naqueles anos, ostentavam com orgulho o título da sua cidade: “Cidade Sorriso”, que se associava à sua pretensa cordialidade ou a “Cidade Universitária”, apontando para o seu bom nível cultural. O governador Moysés Lupion, interessado em aumentar a arrecadação de impostos implantou uma campanha intitulada “Seu talão vale um milhão”. Consistia em incentivar o consumidor a pedir a nota fiscal de suas compras no comércio e, depois, trocá-la por bilhetes nos quais o cidadão concorreria a um milhão de cruzeiros (soma considerável então) em sorteio alardeado com insistência nos canais de comunicação. O povo estava motivado pela campanha, e ao final da tarde do dia 8 de dezembro de 1959, na praça Tiradentes, Antônio Haroldo Tavares, subtenente da Polícia Militar, compra um pente e pede uma nota fiscal. O comerciante, o sírio-libanês Ahmad Najar, se nega a emitir o documento em vista da exígua quantia, apesar de saber que a sua obrigação era emitir a nota, porém, diante da insistência, mandou sua funcionária atender o seu pedido. O freguês,i tomado de indignação passou a destratá-lo com palavras de baixo calão. Os ânimos se exaltaram e acabaram por entrar em violenta luta corporal, vindo o freguês a ter uma perna fraturada. A partir daí, o caos tomou conta da cidade. Era final de expediente e os pontos de ônibus, existentes na praça, estavam repletos de transeuntes que passavam e, fregueses de um bar ao lado, indignados com a cena e mobilizados pelos gritos do cidadão ferido, começaram a apedrejar o bazar. E mesmo com o rápido abaixar das portas pelo comerciante, a turba que imediatamente se formou arrancou-as e invadiu o local, fazendo com que a sua mulher e os filhos pequenos fugissem para o fundo da loja, subissem para o primeiro andar e pulassem através da varanda, para as casas vizinhas. Lá embaixo o rastilho de violência pegou fogo e o quebra-quebra começou. Depredando as casas vizinhas, a massa que se robustecia cada vez mais repartiu-se em duas ou três frentes e continuou a depredar todos os estabelecimentos comerciais, que eram em sua maioria de árabes. Estendeu-se a horda pelas praças e ruas adjacentes, depredavam então tudo o que encontravam pela frente: casas comerciais, não só de árabes, assim como prédios públicos. Com a vinda dos homens da segurança pública, a região transformou-se em batalha campal, tiros, violências, correrias, vaias e bagunça geral. Agentes da polícia civil, batalhões da polícia militar e do corpo de bombeiros se debateram com os mais afoitos, realizando prisões, dando bastonadas e esguichando jatos de água na turba que parecia incontrolável. Alguns elementos chegaram a cortar as mangueiras dos bombeiros e a entrar em luta com agentes da segurança. Todo o miolo da cidade foi percorrido pela procissão de indivíduos e pelas viaturas da ordem pública. Os ânimos vieram a se acalmar somente depois da uma hora da madrugada, quando uma garoa desceu na cidade. No dia seguinte a cidade acordou em calma, mas logo a atmosfera do centro da cidade começou a esquentar. O pessoal vindo dos bairros pela manhã, começaram a se aglomerar novamente no local onde iniciaram os distúrbios do dia anterior. A praça Tiradentes foi tomada aos poucos por indivíduos que ficaram em atitude de espera. Em outros locais naquela manhã, a polícia em ronda pela cidade dissolvia pequenos grupos de provocadores que se formavam com grita e apupos, fugiam e logo se juntavam a outros elementos. Em torno das 9 horas, ouviu-se um grito de “quebra” na praça, e repentinamente a turba explodiu reiniciando as depredações. Cenas bárbaras aconteceram, como o libanês que em frente de sua loja atirou ao chão na tentativa de fazer recuar a horda. O efeito foi o contrário, e este acabou por ser arrastado pela turba por mais de uma quadra a socos e pontapés. Foi internado em estado grave no hospital. Todo o centro da cidade foi tomado pela confusão: pedras, correrias, apupos e busca-pés espocavam na cidade. Como a situação escapava ao controle dos policiais, o governador do estado foi avisado e este então pediu ao comandante do exército da região o apoio de suas tropas. Com tanques, metralhadoras e fuzis calados, os militares ocuparam o centro da cidade e os pontos estratégicos na sua periferia. Com a demonstração de força, os ânimos foram apaziguados e já pela tarde a ordem estava restabelecida, mas sob vigilância cerrada até o dia seguinte O quebra-quebra em seu início foi transmitido por uma estação de rádio de grande audiência e que era ouvida pelas classes populares. O repórter recebeu apelos do delegado para interromper com a transmissão e impedir maior divulgação, pois os distúrbios alastravam-se temerariamente. Em pontos diferentes da cidade pipocavam grupos espontâneos que apedrejaram mercearias afastadas do miolo da cidade. Tanto a polícia como comerciantes árabes e os insurretos fizeram uso diversas vezes de armas de fogo. Uma zeladora que limpava no segunda andar os vidros de um prédio, foi atingida no braço por disparo (pelas leituras de jornais, suponho de um comerciante árabe). Foram mobilizados todos os recursos de segurança : tropas de cavalaria da PME, Corpo de Bombeiros, Polícia Militar e Civil e finalmente as tropas do Exército. Houve várias confrontações, chegando a se reunir uma multidão em frente da chefatura de polícia, na procura de liberar os detidos. Estimou-se em mais de dois mil o número de participantes. Um total de 181 casas comerciais foram danificadas. O Exército desconfiado que por trás de tudo estivesse a mão do Partido Comunista, e temendo alguma ação mais organizada, tomou a iniciativa de colocar destacamentos nas entradas da cidade para controlar e impedir entrada de caminhões ao centro da cidade. Entretanto a versão do delegado de polícia em seu relatório ao comandante da região militar, observa somente a participação de marginais e desocupados. E o final dos acontecimentos terminou como o estampado nos jornais: “Tanques de guerra e baionetas silenciaram o motim popular.” (O Correio do Paraná, 10/12/59". (Extraído de um texto de Jamil Zugueib Neto - No Icarabe.org). Paulo Grani














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